sexta-feira, agosto 3

Os números apontam que é tempo


Khanimambo - Ele chegou um pouco atrasado no encontro da Associação de Muzui. Estava com a fala cansada, seu corpo já andava quase sozinho treinado a longa distância diária.

Chegou para anunciar a saída.

- Preciso ir a Macia. Hoje é começo de mês e preciso entregar as estatísticas para o DDS ( Departamento Distrital de Saúde).

Carlos é o homem dos números da comunidade. Na associação é responsável pelo controle das sementes, da produção e sabe o quanto custa para um alface florescer.

- Anoto tudo no meu caderno. É bom anotar os números, as vezes é confuso. O escrito ajuda a lembrar. Tá apontado, então é isso... Tenho apontamento de tempo que nem lembro. Mas quando vejo o número, lembro do tempo.

Mas desta vez, era de outros números que estava a falar.

Carlos é ativista de saúde da região. Corre com seu corpo para uma casinha de palha todos os dias. Corre porque sua tarefa tem pressa de tempo.

Ele atende todos os camponeses da região.

Nesse mês de julho, os números apontados, dizem que ele fez mais de 230 atendimentos.

- Tem de tudo... é muita málaria. E tem também SIDA, mas só se sabe que é SIDA depois de morto. Até lá, ninguém quer fazer a testagem. Esse mês morreu pouca gente...

Carlos indica os remédios e distribui esperanças todos os dias. É calmo e carinhoso quando fala:

- Não tenho vencimentos por esse trabalho. Nenhum ativista tem. O meu vencimento é que com isso posso tratar de meus filhos.

Carlos tem 2 esposas e 6 filhos e além de seu trabalho na machamba e como ativista de saúde, vive no meio do tempo e dos números.

Corre contra o tempo para aumentar o número da produção.

Torce para que o tempo pare, quando olha cada gota da chuva.

Fica feliz com um número pequeno de pragas em tempos de boa colheita.

Conta as doenças na esperança de tempos melhores.

Não perde tempo e aumenta o número de atendimentos.

E sem pressa e sem perder tempo, não consegue contar a alegria que sente quando escuta:

- Dr. Carlos, Dr Carlos! É assim que me chamam. Eu gosto... é o meu trabalho. Sou eu, não é? - Khanimambo.

3 comentários:

PAI disse...

Lu, aguardo com ansiedade suas estórias da semana. É uma leitura gostosa pela forma e conteúdo. Vc. está me supreendendo pelo texto leve e poético. Penso até que vc. deveria um dia colocar no papel sua experiência. Imagine uma cultura bastante extranha percebida pelos olhos de uma pessoa com sua formação social. Pense nisso. Mas continue contando seus "causos". From Africa with love".

Um beijo no coração

PAI

... disse...

Pai,

A intensidade de tudo por aqui ajuda muito a escrever! Na verdade, é uma das formas de viver e reviver tudo o vejo, ouço e sinto!

Livro, não sei!

Mas jantares na sua casa para longos papo, com certeza!

Tem muito seu aqui comigo!

Beijo da sua filha,

Saudades!

Lu

Anônimo disse...

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