sexta-feira, agosto 10

Afinal, quem somos?


Khanimambo - Sábado, tínhamos acabo de almoçar e estávamos esperando o tempo passar para sair novamente quando tocou a campainha.

Era o Félix, jovem tímido, com ar de cansado e olhar orgulhoso por cumprir uma tarefa tão importante.

Ele faz parte de um grupo, de mais de 12.000 estudantes e professores, responsáveis pelo Censo 2007.

A visita é rápida.

Pergunta-se o nome, tamanho da casa, número de quartos, se é feito ou não cultivo de hortícolas, se tem ou não criação de animais, número de mulheres por família e escolhendo entre as alternativas define-se quem você é!

Simples.

Para essa campanha cívica o governo comprou algumas motos, carros e mais de 2.000 bicicletas.

Antes mesmo das entrevistas começarem, podia-se ver na televisão comerciais convocando o povo Moçambicano a participar.

Em Maputo, carros percorreram as ruas com o alto-falante mobilizador:

- Povo Moçambicano, participe do Censo 2007! É importante sabermos quem somos...


A maioria dos entrevistadores são professores. Portanto, as aulas foram suspensas nesses dias em todo o país.

Na semana passada, os camponeses não foram para as machambas. Queriam estar em suas casas para esperar o "Félix".

- Quem não tá aqui é porque tá em casa para esperar as perguntas. Quem está aqui, deixou a cabeça lá! Associado de Magul


O último Censo foi feito logo depois da guerra e muitos acham que a população é muito maior do que se diz por aí!

- Ninguém entra no mato, para contar as pessoas que moram lá. Nunca foram. Por que agora vão para fazer perguntas? Sr. Antonio, morador de Macia


O clima do país mistura novidade, ansiedade, desconfiança e orgulho.

- 2.000 bicicletas é muito pouco. Os professores não vão aguentar fazer longas distâncias.


- Tem gente que vai inventar gente. É mais fácil preencher tudo aquilo debaixo da árvore.

- Hoje não vou sair de casa. Quero ser contada!

Essa mistura parece refletir a sede de um povo de se conhecer. Saber e valorizar suas raízes, sua história e daí, poder seguir em frente.

Por certo, não serão somente as perguntas do Censo que farão esta tarefa.

A história desse povo não é de múltlipas escolhas. Dentre os poucos caminhos possíveis, muitas vezes não foram eles que escolheram.

A complexidade das multi-culturas, da história da colonização, da recente guerra, da independência de papel, dos acordos de paz, das muitas línguas e tribos, requer uma capacidade de ler o que nunca foi e nem será escrito.

Ou pelo menos com essas letras e números que conhecemos.

Um desavisado, numa das páginas de Mia Couto, nos dá uma dica de onde encontrar a história do povo Moçambicano:


- Esse homem vai carregado de sofrimento.
- Como sabe?
- Não vê que só o pé esquerdo pisa com vontade? Aquilo é o peso do coração. A terra têm suas páginas: os caminhos. Você lê o livro e eu leio o chão.


Khanimambo